A visão estreita do Brasil Paralelo sobre 1964



Assisti ao documentário "1964 - O Brasil entre armas e livros" do Brasil Paralelo e senti que faltou algo.
Embora haja informações inéditas sobre a época e isso é importante pra ser estudado, o documentário tem pontos com problemas sérios que compromete uma análise ainda mais realista da época porque não menciona ou pouco menciona outros fatores. Na verdade apenas reforça a narrativa histórica da direita que não é nova e não contempla toda a complexidade da realidade.

Vou mencionar 5 pontos que faltaram abordar:

1 - Havia no país um bloco de esquerda e outro de direita. Estes blocos, dentro do âmbito institucional, eram coligações partidárias ao qual na direita vinha a UDN de linha conservadora, o Partido Libertador de linha liberal e parlamentarista e, se não me falha a memória, o Partido Republicano. Era a tríade histórica contrária ao populismo autoritário varguista e, depois, contra Jango.
Na esquerda vinha o PSD de linha social-democrata, PTB de linha trabalhista e o PCB de linha socialista/ comunista. Sim, parte dos socialistas/ comunistas era composta por assassinos, terroristas, assaltantes e autoritários de todo tipo, mas socialistas/ comunistas não representavam a totalidade da esquerda da época! Havia democratas à esquerda como os partidos PSD e PTB. Os conservadores pintarem toda a esquerda como sendo socialista/ comunista e, por conseguinte extremista, É UM ERRO HISTÓRICO!

2 - Nem toda a direita apoiava o golpe de 1964. O Partido Libertador defendia a saída de Jango assim como a UDN, mas por meios democráticos. O gaúcho Raul Pilla, líder do partido, já no início da década de 60 sabia dos problemas da tensão da época, da fragilidade das instituições e por isso discursou no parlamento como contrário ao golpe por parte dos militares. Que Jango não tinha governabilidade nem popularidade, isso é fato, mas a narrativa conservadora de que o golpe era o único caminho contra o comunismo NÃO É VERDADE.

3 - Lacerda era um extremista de direita. Atualmente os conservadores o vem pintando como um defensor da democracia, criando o seu mito fundador mas a verdade é que ele não era alguém ponderável. Muito pelo contrário. Quase 10 anos antes ele foi um dos apoiadores de outro golpe militar, o de 1955 liderado pelo general Lott que obviamente não deu certo.
O motivo alegado? Defender o país do "comunista"... Juscelino Kubitschek! Este era Carlos Lacerda, um destemperado, um extremista que mais tarde apoiou outra ideia de golpe militar vinda do udenista Bilac Pinto para o ano de 1964. E o resto é história.

4 - O exército brasileiro não é confiável. De golpes em golpes, o exército derrubou a monarquia (e instaurou a república de forma autoritária), interviu em diversos governos desde a República Velha ao período de Vargas, interviu na redemocratização pós-Vargas e então governou de forma ditatorial através de autoritarismo e sanguinolência. E hoje, timidamente, tenta mudar sua imagem.
Para o exército, 1964 foi mais do que frear o comunismo. Foi também a oportunidade para impor o seu modelo tecnocrata positivista que vinha sendo construído já durante o período monárquico.

5 - Bem como a esquerda, a direita foi perseguida pelos militares e também foi tirada do debate público. Mas diferente da esquerda que continuou se organizando politicamente dentro e fora do âmbito institucional, tanto de maneira extremista quanto democrática, a direita se acomodou e desistiu da política. Isso ocorreu porque independente do país não ter liberdade civil, cidadãos não poderem se expressar e de não terem direitos legais assegurados esse cenário de medo e repressão do país era favorável pro modo de vida conservador.

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